Fonte de S. Sofia |
Há não tanto tempo assim a minha vizinha, lavadeira ainda profissional, no tanque das lavadeiras da Bica do Chinelo, dando livre curso á sua memoria da Vila Franca antiga da qual apenas uma parte conheço testemunhalmente. Para isso contribui o facto de os meus ancestrais não serem de cá, logo não têm memória destas coisas para lá da minha própria…. Acredito até que vadio que sempre fui, bebi bem mais da cultura popular desta terra que eles, os meus pais…. Bom, de qualquer forma tudo o que fique para lá de mil novecentos e cinquenta e cinco, do Século passado, estes olhos não viram, os ouvidos não ouviram, este nariz não cheirou. Estive então à conversa com esta personagem impár, (a minha vizinha lavadeira) na esplanada do café, snak e tudo: O Tanque, na bica do Chinelo. Contava-me ela da senhora de S. Sofia…. Não conheceste filho? Áh era uma senhora muito linda que se banhava nua na cachoeira da ribeira de S. Sofia e que tecia bordados, que voltava a desmanchar, e de novo bordava. Que mãos lindas e delicadas que ela tinha… Toda ela era linda, na verdade!
Hoje Sol aberto que Deus o dava o mesmo local e a mesma curiosidade da minha parte…. Óh vizinha conte lá melhor essa coisa da senhora de S. Sofia.
Ai filho era a Senhora do Cravo, um amigo ao lado confirmava, que sim senhor, era a mãe do tal e tal…. Precisamente! Ajuntou ela, que prossegue:
- Ai era uma beleza, mas não era maluquinha, ficou assim dum parto de um filho. Era uma senhora muito fina!
Então e porquê do Cravo? Pergunto.
Porque era a dona da quinta do Cravo!
Pensei de imediato que esta simples e comezinha realidade seria mais que suficiente para que, manipulando um ou outro facto… Sei lá…. A pureza da nudez da senhora, a cantar uma cantiga à santa do local, no acto obsessivo de bordar sentada nas ervas junto ao regato…. E estava “caldeirado” um fenómeno digno de romaria popular à Beata, que deu o juízo pelo filho… Já vi romarias a locais de culto, começarem por muito menos…
Se pelo contrário a senhora fosse feia com’á noite e andasse a levantar as saias aos passantes, então cresceria a lenda duma bruxa tenebrosa e má para afugentar os rapazes da ribeira, e os manter na linha. E foi na linha que eu a conheci: A Ribeira, ainda foi por muitos anos, límpida e farta d’águas, onde era possível colher agriões e outras coisas de comida….
Talvez a Senhora do Cravo faça o milagre de deixar a Ribeira correr como outrora e voltar a deixar crescer nas margens e baixios, os agriões bem picantes. E dar de beber aos passarinhos que de mil cores lhe enfeitavam as árvores que ornavam as suas margens.
Acabei o cafezinho, despedimo-nos todos até depois e abalei para casa para me agarrar aqui ao PC, e repassar estes novos conhecimentos que considero não dever reter.
António Capucha
Vila Franca de Xira, Agosto de 2011
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