Bela adormecida

Bela adormecida

Os cabelos espalhados sobre a almofada, de um negro asa de corvo em grossos caracois. O corpo elástico em posição fetal. Uma perna por sobre as cobertas e outra por dentro da roupa de cama. E o Sol a insinuar-se por entre as frestas da persiana, projectava-se na parede contrária à janela como se de cinema se tratasse e esbatia todo este quadro de serenidade com a luz difusa e leitosa que alumiava o quarto. Uma manhã de Sol esplendorosa, ao que parece. Na parede frente aos pés da cama, a luz acorda uma fiada de “Barbies” e outras bonecas que não dispensou quando cresceu e o seu corpo se começou a parecer com o das bonecas: Pernas altas, costas direitas, seios firmes, mãos esguias e pés afilados. Ao lado numa estante os livros da sua infância ainda não tão distante assim. Alinhados e direitos ao alto, de lombadas para fora.

Sobre uma cadeira, a roupa que despira na noite anterior, dobrada a preceito.

Um roupeiro de duas portas e uma pequena mesa-de-cabeceira completam a mobília do “templo” da musa adormecida. Sobre esta última, um candeeiro com um “abat-Jour” da “minie”, não sei se sabem: A namorada do rato Mickey”, e um despertador no seu tic- tac, em surdina.

Na parede por cima da cabeceira da cama, um “poster” gigante de Michael Jackson, naqueles preparos de espectáculo,

Por fim ela move-se, roda sobre si própria cerca de cento e oitenta graus e troca as pernas: A que estivera coberta fica agora exposta e a outra ao invés, coberta, instintivamente, passa as mãos sobre o rosto afastando algum cabelo desalinhado que incomodava. E volta a serenar.

Juntinhos e debaixo da cama dois chinelos de quarto em forma de gato, felpudo e com bigodes escuros, ainda não se distinguem bem as cores, à parca luz invasora, mas o bichano parece rosa…. Bom …. É de cor clara.

O edredom também em tons pálidos, talvez também rosados, bem como os lençóis e almofada. Prece um cenário de conto de fadas….

Ver assim dormir uma criatura destas, é como contemplar uma paisagem de montes cobertos de erva até perder de vista, com uma floresta a orlar um dos lados enquanto que, ora manso ora rápido corre um ribeiro de águas murmurejantes e cristalinas por entre as rochas  ou espraiando-se num vale mais plano….. Tudo transmite calma e doce serenidade….. Interrompida pelo trim-trim chinfrim do despertador….

A moça acorda, estica as pernas, espreguiça-se, sai da cama, levanta o estore. Uma enchurrada de luz que a todos cega, irrompe pela divisão inundando-a. Ela enfrenta o Sol, e reflexamente espirra.

Confirmam-se os tons de rosa dominantes e a rapariga é linda como parecia ser, e a sua pele lisa fresca e elástica, que se adivinha macia ao toque, é de um tom lindo de chocolate negro.

Tenhamos todos um BOM DIA…..

                        António Capucha

      Vila Franca de Xira, Janeiro de 2011