Nos idos de setenta e nove, oitenta, do Século passado, as férias eram algo de memorável, tal a densidade de acontecimentos notáveis , porque jocosos, os mais deles, dignos de registo. Trago-os na mémoria, e antes que aconteça qualquer fatalidade, é melhor que a registe, e partilhe convosco. Depois me dirão.
O local era a praia do Meco, e a fauna ocupante era qualquer coisa de se lhe tirar o chapéu. O nosso grupo era constituído por mim "mai'la" minha cara metade e um sobrinho marau que vinha com ordens superiores de me obedecer em tudo e estudar muito. nunca tal "houvera" visto, um escravo branco para me obedecer em tudo. está claro que era um gosto vê-lo à noitinha à hora de dormir o petiz de joelho em terra a beijar-me a mão e dizendo :boa noite, querido tio! O espectáculo era presenciado por todo o acampamento e havia direito a palmas e tudo. Isso mais as caçadas aos gambozínos, cujos se dividiam em três grandes grupos, a saber: Os gambozininhos, os gambozinos, propriamente ditos e os gambozinões, estes mais agrestes. depois as lições de portugês: dadas na praia para devaneio do pagode. Vá diz lá: como se diz muitos lobos? Alcatifa. E um barco muito grande? Banquete. E assim por aí fora. E as lições de geografia! Bom, eram assim: Óh tio, óh tio, o que é aquilo ali? Apontava o caramelo para a barra de Cascais e praias da linha que dali se avistavam. E eu esclararecia: então meu rapaz, que oceano é este? Pressuroso respondia : é o Atlântico! Então o que fica do outro lado do Atlântico? A América! nunca pensei que estivesse aqui tão perto! Pois é meu rapaz. è o chamado erro de pára-lapiz. ( paralax). bem ele saiu dali com a lição bem estudada. Havia o costume entre alguns banhistas, de se lambuzarem todos com argila que colhiam na falésia, Costume estranho, comentava o rapaz. Eu elucidei-o de que os adultos faziam aquilo para terem farta cabeleira na região púbica. Ora ele carequinha de todo passou a andar com fortes pachos de argila na região púbica, e quando voltou para casa insistiu em levar um grande pedragulho de argila, para continuar os tratamentos. Mais tarde vim a saber pela minha irmã que o artista mantinha com a professora grossas teimas acerca do que eu lhe tinha ensinado cujas definições se eu as dissera eram lei. Entre a população estival do Meco, uns abundavam, que eram simplesmente notaveis , não porque fizessem algo por isso, eram-no apenas e tão só. Figuras impares como o pianista e a sua "partnair" a D. Jú. Que era assim como a Monsserrat Cabalhet. Fazia dois dele e que não o deixava põr o pé em ramo verde. Ele terá sido pianista animador de salões nos paquetes de recreio, e ela era professora de canto lírico. E aos serões à volta duma fogueira cantavamos quadras soltas o mais das vezes porcalhonas mas jocosas. Eu esgalhava a guitarra e aquilo era uma festa, onde havia sempre algo para grelhar no lume. Uma bela noite estava o arraial armado chega-se-nos um grupo de pinantes bem orquestrados e entram na desgarrada, carregando na mostarda. A D. Jú, furiosa, porque perder nem ao botão, ela que usava sempre um português muito fidalgo, diz-me pelo canto da boca Chegue-lhes com aquela dos cagalhões, Sr. tonica! Caí do espanto abaixo mas fi-lo. Manda quem pode. O Pianista tinha um mala térmica onde havia de tudo, restos de fruta, saltos de sapato, colas, pacotinhos de pudins para ele juntar ao leite, porque não lhe tolerava o sabor, e um dia convida o meu sobrinho para o pequeno almoço. Mas o gajo gostou das mixórdias do pianista e reincidiu, umas quantas vezes.
Doutra vez o pianista estava meio metido , meio fora da tenda pequena em que eles dormiam. E revolvia-se furiosamente. Veja lá S. tonica (Meu deminutivo íntimo) aquela gaja está-me p'ráli metida em sarilhos e um gajo aqui à espera, sabe como'é que é, um homem tem necessidades.... Vá lá por favor buscá-la que ela a si tem respeito. Ao ver o amigo em apertos tão fininhos, resolvi que sim senhor, iria lá. Bom o borburinho resultava de o marido de uma Senhora, tão discreta que não parecia capaz de partir um prato. Mas que afinal tinha partido a loiça toda, tinha fugido para o Meco com o seu amor de circunstância. O marido vei-o reclamar o que por direito achava pertencer-lhe, e a coisa pegou fogo. A boa da D. Jú lá estava, para saber de tudo em primeira mão, e meter-se de permeio entre o marido e a fugitiva. Lá a trouxe de volta ao lar apertado. Para o pianista a dedilhar a preceito. Havia outra parsonagem, o dezoito, que andava sempre bêbado como um carro. Tinha uma mulher linda e eram Irlandeses. Ele juntava-se a nós para o fóró, E um belo dia estavamos a comer melão e o meu cunhado dáva-lhe as cascas. toma pá é bom!E o reco passou a noite a comer casca de melão. A mulher dele aparecia uma vez por outra á procura dele e cantava uma canção celta. Um sacola dum Beef, na praia teve o azar de se chegar de mais a nós, e um cão que eu tinha na altura, velhaco como tudo, daqueles que correm atrás das motas, sabem como é? Que se chamava neribi. Rosnava-lhe forte e feio. O Beef continuava de mão estendida e no seu português algarvio ia dizendo: toma, ser bom, ser presunta. Dei uma palmada no cão e um banho de Mar, foi o calmante de circunstância. Não fora isso, e a imprensa britânica no dia seguinte diria do desaparecimento misterioso dum súbdito de sua majestade (curva) ao que se sabe a população local é um tanto selvagem mas não consta que seja troglodita. O mais provável é que tenha sido apanhado por uma matilha de lobos, machos, porque dele apenas resta o pirilau, o farto bigode e a fornalha do cachimbo.
Tempos heroicos esses em que jovens, eu e a D. Maria, andávamos por ali como Deus queria, porque assim, nos terá feito. Dizem. A Revolução tinha fenecido, havia pouco. Mas felizmente ainda não havia Cavaco Silva, foram Bons tempos, apesar de tudo.....
António Capucha
Montijo, 7 de Setembro de 2012
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